Samba e amor

Tenho muito sono de manhã

terça-feira, 25 de dezembro de 2007

As boas coisas da vida

Uma revista mais ou menos frívola pediu a várias pessoas para dizer as "dez coisas que fazem a vida valer a pena". Sem pensar demasiado, fez esta pequena lista:

- Esbarrar às vezes com certas comidas da infância, por exemplo: aipim cozido, ainda quente, com melado de cana que vem numa garrafa cuja rolha é o sabugo de milho. O sabugo dará um certo gosto ao melado? Dá: gosto de infância, de tarde na fazenda.

- Tomar um banho excelente num bom hotel, vestir uma roupa confortável e sair pela primeira vez pelas ruas de uma cidade estranha, achando que ali vão acontecer coisas surpreendentes e lindas. E acontecerem.

- Quando você vai andando por um lugar e há um bate-bola, sentir que a bola vem para o seu lado e, de repente, dar um chute perfeito - e ser aplaudido pelos serventes de pedreiro.

- Ler pela primeira vez um poema realmente bom. Ou um pedaço de prosa, daqueles que dão inveja na gente e vontade de reler.

- Aquele momento em que você sente que de um velho amor ficou uma grande amizade - ou que uma grande amizade está virando, de repente, amor.

- Sentir que você deixou de gostar de uma mulher que, afinal, para você, era apenas aflição de espírito e frustração da carne - a mulher que não te deu e não te dá, essa amaldiçoada.

- Viajar, partir...

- Voltar.

- Quando se vive na Europa, voltar para Paris; quando se vive no Brasil, voltar para o Rio.

- Pensar que, por pior que estejam as coisas, há sempre uma solução, a morte - o assim chamado descanso eterno.


(Rubem Braga em 'As boas coisas da vida')

FELIZ NATAL! :)

segunda-feira, 24 de dezembro de 2007

Sempre fui simpática à causa do MV-Brasil - pra quem não sabe, um movimento que surgiu aqui no Rio que defendia não usar expressões em inglês desnecessariamemte. Tenho muita preguiça de "ASAP" ("as soon as possible"), "job", "sale" e outras expressões usadas em inglês por aí. A tática deles é colar cartazes pela cidade, e um dos mais engraçados dizia "Halloween é o cacete! Viva a cultura nacional!"

Mas desde que o criador se candidatou a vereador (se não me engano), já comecei a ficar com um pé atrás. E o último cartaz espalhado pela cidade é o fim:

domingo, 23 de dezembro de 2007

Parafraseando Drummond

Tenho duas mãos e a preguiça do mundo...

quarta-feira, 12 de dezembro de 2007

Indignação?

Queria ter postado isso aqui antes, mas o dia-a-dia anda tão corrido que não deu.

A Cecilia Giannetti, colunista da 'Folha', contou que essa sua coluna provocou reações extremas dos leitores do jornal, que têm escrito chamando a jornalista de "nazista" e coisas do naipe.

O pior de tudo isso é que o texto não fala mais do que a verdade. E, em vez de se indignar com tanta coisa errada que tem por aí, as pessoas vestiram a carapuça sem ter o bom humor de imaginar que todo já passou por uma situação pelo menos parecida com essa - o que são os shoppings perto de datas festivais, especialmente o Natal?

Que preguiça, meu Deus.

É quase Natal e, principalmente nas metrópoles, as pessoas se organizam em violentas hordas para fazer compras. Quem acredita no fim da família nuclear deveria observar o fenômeno - seguramente à distância, como eu, acuada num banquinho da praça de alimentação de um shopping center. As gangues familiares percorrem os shopping como arrastões de classe média, aglutinações de gente ávida por crediários e embrulhos, parcelamentos e cadastros que requerem CPF. Incapazes de desviar de qualquer um que tente olhar as vitrines sozinho, formam uma corrente que não se parte, unida por laços de sangue e consumo. Roubam-nos tempo, paciência e, às vezes, até mesmo uma lasca de nosso dedinho do pé, quando passam pisoteando o que houver pela frente. Seguem como um imenso trator, sem desviar nem mesmo quando lançamos um inútil "dá licença?".

O paizão vai de mãos dadas com a filhinha mais nova, uma criança que atinge agudos na freqüência de 20 Khz. São duas peças-chave do arrastão consumista, caminhando quase sempre emparelhadas a uma quase sempre rotunda mãe. Esta, por sua vez, carrega um pacote junto aos quadris, adicionando pelo menos mais 15cm à parede humana.

O comprador solitário tenta furar o cerco inicial, imaginando que estará livre para andar em seu próprio ritmo ao ultrapassar a barreira criança + pai + mãe + pacote. Tal configuração é uma armadilha: é aí, justamente, que se vê impedido pela segunda camada da família-em-compras. Para locomover-se outra vez com desenvoltura, terá de passar também pela filha crescida do casal, abraçada a um mastodonte bombado em academia, ambos estrategicamente posicionados mais à frente. A voz da moça é a versão teen dos agudos da caçula, agora ajustados para conversar sobre tópicos que tornam preferíveis os gritos ininteligíveis da pirralha. Esse fator é uma arma importante no processo de fragilização da vítima: a insalubridade dos diálogos da dupla de adolescentes confunde seu raciocínio, imobolizando a presa enquanto dura o assunto do casal.

Se conseguir retomar a consciência e ultrapassar esse nível do arrastão, surgirá em seu caminho o obstáculo móvel: um guri de mais ou menos 5 anos de idade que se desprendeu da mão da mãe (lembre-se: ela está na retaguarda da operação, carregando um enorme pacote) e agora fica saracoteando lá na frente do grupo. Conforme o corpo estranho - comprador solitário - tenta retornar ao mundo exterior, indo para a esquerda, o guri vai para o mesmo lado; quando tenta escapar pela direita, ele acompanha seu movimento outra vez, ad nauseum.

Quem cai nesse redemoinho pode ser arrastado por quilômetros até que consiga terminar suas compras. Ou sem que jamais possa fazer o que pretendia no shopping. Há o caso de K., para citar apenas um exemplo, que, feito refém de uma família de consumidores selvagem e numerosa na semana do Natal passado, foi expelido de volta ao shopping tarde demais. Mais ou menos em abril deste ano, quando acabou novamente capturado por outra família, nas Lojas Americanas, durante uma promoção de ovos de Páscoa.