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quinta-feira, 5 de maio de 2005

Neguinho é foda

A Patrícia, uma amiga também jornalista, me mandou dois textos sobre a cartilha Potiliticamente correto, "distribuída na última semana a parlamentares, professores, policiais, jornalistas, organizações não-governamentais e pessoas envolvidas com políticas de direitos humanos".

Comecei dizendo a ela que achava essa história de politcamente correto um saco e entramos numa discussão por email. A minha opinião é de que, no caso do uso de certos termos, o preconceito tá muito mais no contexto, na criação de estereótipos etc. Depende do contexto. Dizer que alguém é preto não é preconceituoso, mas dizer "seu preto" (considerando "preto" um xingamento) ou "preto safado" é. Questão de bom senso.

O Zuenir Ventura publicou ontem no Globo uma coluna sobre o assunto. Ele também acha que a carga tá muito mais no contexto do que num termo em si. Claro que concordo que certas coisas devem ser evitadas. Como falar "paraíba" ou "baiano" com a intenção de ofender ou desmerecer alguém (assim como "negro" pra ofender). Alguns termos trazer uma carga pejorativa, sim. Há casos e casos. Mas eu mesma chamo meu irmão mais novo de "neguinho", de forma carinhosa, e ele me chama de "neguinha". A palavra, aí, ganhou outra conotação. Diferente de se referir a alguém como "aquele neguinho ali".

Um exemplo: eu tenho um irmão que tem síndrome de Down, o Breno (esse mesmo que chamo de neguinho). Uma vez, numa discussão, chamei ele de retardado e minha mãe ficou puta. Mas eu não chamei ele no sentido pejorativo, me referindo ao fato dele ter síndrome de Down: chamei como qualquer irmã xinga um irmão quando briga, chamei como chamo meu irmão mais velho. Até porque não considero a síndrome de Down um retardo, e sim uma série de características, só isso.

Acredito, por outro lado, que muitas palavras já perderam a carga preconceituosa. Por exemplo: mulata. Não vou dizer que uma pessoa que tenha traços de miscigenação seja negra. Porque ela não é! Quem tem traços de DUAS raças não é negro! Nos EUA, por exemplo, até faz sentido: lá qualquer pessoa com mistura é considerada negra. Mesmo que seja um loiro de cabelo enrolado ou lábio mais grosso, por exemplo.

Mas também não concordo com esse papo de "liberdade de imprensa" que muita gente usou pra criticar a cartilha. Isso pra mim é balela, não é por aí que critico o policamente correto. A questão são os excessos, só isso. Nem todas as palavras que surgiram de hábitos preconceituosos trazem essa carga ainda ou sempre. Assim como palavras inocentes em seu surgimento (em termos etimológicos) hoje têm uma carga pejorativa. Exemplo? "Medíocre". Significa "na média", mas todo mundo encara como "ruim".

Enfim, é um longa discussão. Sou uma pessoa que atenta ao preconceito o tempo todo, até porque sei que não tô livre de ser preconceituosa em algum momento, de alguma forma. Mas também acho que o exagero pode gerar distorções, vide os Estados Unidos. Lá todo mundo se ofende com tudo, ninguém pode nada. Haja paciência.

E mais: os eufemismos usados para substituir certos termos muitas vezes são ridículos. Sinceramente? Não acho que chamar alguém que vive na rua de "pessoa em situação de rua" vá mudar a realidade dessa pessoa. Nem mesmo em termos de auto-estima.

No fim, só concordo plenamente com uma coisa: foi gerada uma discussão em torno do assunto e isso é importantíssimo.

5 Comments:

  • At 3:22 PM, Blogger Luciano Matos said…

    Bruno, como sempre, preciso. Isso aí. A cartilha pelo que entendi - posso estar errado, não li muito a respeito ainda - é uma sugestão, não é uma lei. Acho uma boa proposta e esses jornalistas imbecis que ficam achando que qualquer coisa é censura. Parece que estão com saudades de tempos atrás. Regulamentação por exemplo, qualquer cois que se toque nesse sentido acusam logo de censura. Como dizem por aqui: Faça-me uma garapa.

     
  • At 3:31 PM, Blogger Kamille said…

    Esse papo de censura é um saco, sim. Liberdade de imprensa? Sei. Como se jornalista pudesse falar de qualquer coisa em jornal (ou tv, ou revista).

    Mas por exemplo: se eu quisesse escrever que é palhaçada, pela cartilha não podia, porque é um termo que eles sugerem evitar. Exagero ou não?

     
  • At 4:38 PM, Blogger caco ishak said…

    cartilha e imprensa não são antônimos? o quê? liberdade e imprensa também? ah, então tá tudo certo.

     
  • At 5:31 PM, Blogger Kamille said…

    Existe, sim, Bruno. Mas eu acho um saco do mesmo jeito. A cartilha foi só um gancho pra eu falar do movimento politicamente correto como um todo.

     
  • At 2:25 PM, Anonymous Anônimo said…

    Eu odeio gente politicamente correta ¬¬

     

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